sábado, 6 de dezembro de 2008

Girassóis


Ela se chamava Julie. Desenhista, esguia e inquieta, com um acento britânico inconfundível. Falava alguma coisa em espanhol. Ele, um pouco de inglês. Entenderam-se com os corpos quentes que fremiam ao se tocar. De um modo que não era possível ver as cicatrizes que carregavam, mas adivinhavam, um no outro, as marcas de suas paixões. Ela falou em girassóis. Foi como um beijo roubado, uma tontura de gozo, um prêmio, uma revelação. Em alguns meses aprendeu com Julie que existe um quartzo brilhante empregado em joalheria chamado girassol. Êxtase.

Agora, enquanto permite-se acompanhar as pinceladas tão antigas, as lembranças intrometem-se porque o tempo o acossa. No avião disse a Julie que iria fazer uma tatuagem. Ela não perguntou o que seria, apenas recostou-se nele enquanto olhava as nuvens. “Tem gente que coleciona todo o tipo de inutilidade. Fetiches. Tem gente que não perde o X-Files, que tem pôster da Marilyn Monroe pela casa, adora a Mona Lisa, torce por um time de futebol (ele preferia os jogos da NBA). Eu gosto de girassóis, como poderia eleger os diamantes?", disse.

O traço de Van Gogh era o que ele esperava de um traço de Van Gogh. E, estar diante dos Girassóis, em uma sala da National Gallery, em Londres, tinha um significado que nem mesmo ele compreendia. Não era para decifrar, era só para viver aquele instante sagrado. Ficou horas diante do quadro de pequenas dimensões até ouvir, pelo alto-falante, que iriam fechar. Caminhou lentamente passando pelas inúmeras alas sem olhar para as obras expostas. Em outra ocasião talvez, não agora que Van Gogh impregnava suas retinas.

Lá fora, ao olhar para o céu, percebeu, meio sem querer, que um enorme girassol resplandecia sobre Londres.

(Trecho do conto Girassóis, do livro O Imprevisto)

8 comentários:

Daia disse...

Adorei esse trecho.
Me deu vontade de ler mais!

Beijos, bom final de semana prof!

Daia disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Biba disse...

Oi Daia, fico feliz que goste dos meus contos!
beijos e bom final de semana.
Carpe Diem!

adri antunes disse...

eu tb gosto dos seus contos, quero um livro seu, pra ler todo!!! como faço???
um bjuu e obrigada pelos elogios! hj, sábado, passei o dia todo dentro de casa estudando, acredita? tdo bem...faz parte!
bjusss

Biba disse...

Ah, Adri, o livro. É assim: tem aqui em casa e na Livraria do Maneco. Acho que você ia curtir muito esse meu O Imprevisto. Assim como curto seus poemas. Quanto aos elogios, são verdadeiramente merecidos.
Beijo grande,
Carpe Diem!!!

Biba disse...

Um comentário foi excluído. Acho que a gente deveria ter o direito de excluir sem ficar essa marca nos comments.

Daia disse...

Sim, também acho.
Fui eu que excluí, pois quando postei saíram duas mensagens iguais.
Já sabia que ia ficar essa marca boba, mas antes ela que duas mensagens iguais Oo.
Também acho que ele nunca deveria colocar duas mensagens iguais se a gente só queria uma!
hehehehehe
Beijos prof!

Biba disse...

Oi Daia. Comigo também já aconteceu de sairem duas mensagens iguais e igualmente eu excluí o comentário repetido. Mas essa marca é realmente um saco, né?
Beijão querida
Carpe Diem!!!