quinta-feira, 30 de abril de 2009

Veja bem, com teus olhos pardos que eu queria verdes como os de minha avó. Veja, estou despida e nua e desnudada. Veja, o que te impede de olhar para o meu corpo que agora se oferece sem vaguidão? Olha!! Meu grito é imprevisível e você fica atrapalhado no silêncio de olhar mas não ver. A cicatriz é imensa. Foi por aqui que eles entraram. Abriram meu corpo na altura do tronco e foram até quase a garganta. Não sei o que aí fizeram. Mas dizem que assim me salvaram. Então olhe agora que já sou quase apenas ossos. Essa cicatriz vai ser tua lembrança olhos pardos. De tudo que de mim há de ficar em tua boca será o gosto amargo deste dia em que te mostro minha dor sufocada. Não há cura, eles disseram. Mas todos foram unânimes que era preciso abrir e assim o fizeram com seus instrumentos desinfetados. Está bem, não olhe mais. Vá para casa e perdoe meu desalinho, minha nudez medonha, minha morte iminente.

domingo, 26 de abril de 2009

Se pudesse escolher, queria ser uma personagem de Isabel Coixet. Queria ser tudo o que não posso e refletir como a heroína de Minha Vida Sem Mim, "somente no supermercado não pensamos na morte".

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Ela

Tem um jeito de saudade com dor de garganta. Aprecia o sol pelas frestas da cortina de cor indefinida. Brinca com os anéis. Pontua uma interrogação no ar. O que indaga? Diante dela o dia fabuloso, sem nenhuma rispidez, nenhum martírio. "Essa vida é um calvário", dizia o namorado. Era que, para ela, a vida era sempre uma perfeita novidade. Mas havia dias em que pensava se ele não tinha razão. E, se acontecesse algo embrutecedor. Torturante. Largo. Porque para ela as coisas estreitas é que valiam à pena. Nesse dia foi que viu a pequena fonte já sem água em cima da mesinha. Sentiu um arrepio de mau agouro. Até então não sabia ao certo, porém, era supersticiosa.

terça-feira, 21 de abril de 2009


Alguma coisa a gente espera. Um dia raioso de sol. Um abraço amigo. Um beijo na boca. Uma conversa trivial. Uma olho no olho. E assim a gente vai seguindo. E, como se fosse sempre feriado, tomo um bom vinho sozinha mesmo, acendendo velas, espiando as coisas esquecidas. Tenho um vago olhar para o futuro, mas tudo que é ontem me interessa, como se eu fosse carangueijo, andando para trás. Mas sou bem geminiana e desconverso quando o assunto é saudade. Digo que quero viver o agora e, pluft, ele já se foi. Por isso tenho que andar às avessas, permeando o ontem e tateando o futuro. Mas esse é tão imponente... Eu poderia simplesmente agora, olhar nos olhos dele, meio verdes meio azuis e dizer das coisas que sinto. Mas hoje, nesse feriado, não há esse entremeio. Uma televisão nos separa. Mas ele abriu o vinho para mim. Será que não é o suficiente?

segunda-feira, 20 de abril de 2009


Era sábado, tinha sol, saí para dar uma volta no final da manhã. Quando voltei, meu gato tinha caído da sacada do terceiro andar. Ele parecia bem, mas de repente começou a mancar e andar desengonçado. Hoje vou levá-lo ao veterinário. Agora ele só tem seis vidas...

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Clarice Lispector

"Dá-me a tua mão:

Vou agora te contar

como entrei no inexpressivo

que sempre foi a minha busca cega e secreta.

De como entrei

naquilo que existe entre o número um e o número dois,

de como vi a linha de mistério e fogo,

e que é linha sub-reptícia.

Entre duas notas de música existe uma nota,

entre dois fatos existe um fato,

entre dois grãos de areia por mais juntos que estejam

existe um intervalo de espaço,

existe um sentir que é entre o sentir

nos interstícios da matéria primordial

está a linha de mistério e fogo

que é a respiração do mundo,

e a respiração contínua do mundo

é aquilo que ouvimos

e chamamos de silêncio."

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Por vezes fica difícil entender o ser humano. Tenho me repetido nessa constatação, deve ser porque sou teimosa. Não aceito respostas fáceis. Ontem tive uma experiência esmagadora sobre o quanto as pessoas podem ser cruéis usando apenas palavras. Cortantes, envenenadas, rasteiras. Não sou de me indispor com os outros, mas creio que dessa vez deixei transparecer todo o meu desapontamento e nojo. Nojo sim, dessa espécie que se diz humana, que apregoa preceitos como liberdade. Hoje estou recuperada, depois de trocar ideias com gente de verdade. Mas não me acomodo, vou mesmo é incomodar se for preciso. Hora dessas explico melhor esse assunto, por hoje só queria dizer que às vezes é realmente muito difícil olhar o Outro e ver. Porque o que enxergamos pode ser aterrorizante.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Meu anjo extraviado

Eu acredito em morangos, girassóis e borboletas. Eu vivo de catar conchinhas na praia imaginária Eu vivo de agradecer o tanto que tenho recebido ultimamente. Eu acredito em um anjo extraviado. Eu tenho ganas de gritar, às vezes, de pura emoção fortíssima. Olho por trás do fundo do espelho e posso ver o que sou. Tenho medo disso, desse olhar meu que me olha e não entendo direito se ele ri ou chora.
Eu acredito na grandeza do universo e em seus andaimes ambulantes, consertando estrelas cadentes. Tudo que é sem rumo me interessa, tudo que é vazio intercepta por mim para que meu caos se aninhe e fuja da entropia. Tudo que sei é que gosto de gatos, rosas e jardins. E que o livro vai se chamar qualquer coisa Caio F., pois foi aprovado pelo Conselho Editorial da Educs. Eu acredito que ele espiou, deu aquela olhada lá de onde está e falou com alguém muito importante intercedendo por mim. Nisso eu acredito, pois sou ainda inocente para coisas tão inesperadas.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Hora de descansar

Às vezes é assim. Precisamos dar um tempo para dentro e fora de nós. Nada como viajar nessas horas. Mesmo que seja viagem curta, para aproveitar um feriadão, isso nos move e comove. Alerta os sentidos e traz alegrias inesperadas pelo caminho, assim como alguma eventual tristeza (nunca se sabe ao certo). O importante é seguir em frente. Dentro do carro, ouvindo aquela trilha sonora especial, dá para pensar, conversar e contemplar a paisagem que da Serra desemboca no Pampa. Volto na segunda, até lá!!

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Lume

Os vidros sujos, por onde escorrera a chuva, deformavam a paisagem. Havia pessegueiros floridos tremendo ao vento e um abacateiro quase vergando sob seu próprio peso. O passado estampava-se naquele quintal. “As coisas antigas ganham uma imponência que se assemelha a do homem velho. Há nele sabedoria e desilusão, uma fortaleza que o tempo corrói impiedoso”, escrevera Leon. No quintal, latas e tonéis se amontoavam e todo tipo de velharia carcomia-se ao ar livre. Algumas lesmas arrastavam-se por cima das pedras.

Não estava lá, o gato lambendo as patas depois de caçar um beija-flor sob os protestos de um menino ingênuo. Nem havia o som da flauta doce insistindo nas tardes outonais. Tampouco eles estavam lá, sentados à sombra das árvores, tomando chimarrão e contando histórias impressionantes. Para além dos vidros sujos existia o passado que não era aquilo que se via agora. Mas estava lá, estagnado. Lebasi sentia o cheiro de terra molhada que era também um vestígio desse ontem remoto.

As mãos dentro dos bolsos apertavam-se. As lembranças iniciavam um vôo cego. “As estrelas estão caindo, olha! Meu Deus isso é lindo demais!”, a voz entrecortara-se de emoção.

Nesta mesma janela, em uma noite de inverno, eles olhavam o céu estrelado depois de um ritual perigoso. Na panela, o vinho fumegava e os pedaços de cogumelo pulavam como se estivessem vivos. Serviram-se. Conchas de sopa, canecas de louça, mais de uma vez. Beberam ainda quentes, e comeram os pedaços que boiavam na superfície. (Trecho do conto Lume, de O Imprevisto)

domingo, 5 de abril de 2009

Kurt Cobain


Existe o bom em todos nós e acho que eu simplesmente amo as pessoas demais, tanto que chego a me sentir mal. O triste, sensível, insatisfeito, pisciano, pequeno homem de Jesus.(Trecho da carta suicida)

sábado, 4 de abril de 2009

Fim de semana

Carpe Diem, pois é, vem do barroco, embora seja latim. Significa como está escrito na abertura desse blog: "Aproveite o dia". Então, o que desejo a todos os meus visitantes neste fim de semana é que aproveitem o que lhes for dado, o que for obtido, o que for enviado. Encham suas mentes de alegrias incontidas e tenham muita luz em cada sentido diluído do querer. Enquanto tomo um licor de Amarulla, insisto em que fiquem bem e descansem, vivam e corram perigo, porque o existir de fato tem um pouco de tudo isso.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Na ponta do lápis


Hoje, ele disse que sou uma sonhadora. Que preciso ser mais racional, colocar as coisas na ponta do lápis. Foi assim que ele disse, bem desse jeito. Nada de romantismo. E eu, hipersensível pensei em apenas calar porque às vezes não se tem argumentos quando as pessoas são assim tão racionais. E, nunca fui desse jeito. Pois, se eu ia chorar no banheiro da escola quando alguém me tratava mal. Porque as crianças sabem ser malvadas também, umas com as outras. E eu apenas ficava abismada com vontade de sumir. Um dia disse à minha avó que o mundo era muito cruel. Ela falou que eram os homens, não o mundo. Então, fiquei meio sem entender, uma vez que o mundo é repleto de homens e os homens complementam o mundo. Desisti de compreender e fui em frente. Até na faculdade, ia para algum canto do campus chorar. Um choro manso, cheio de uma doridade que era peso demais para uma menina. A vida foi me ensinando muitas coisas. Sou boa aprendiz. E, sei, sou romântica e sonhadora sim. Tá na ponta do lápis, viu?

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Então...

Na verdade, sou muito tímida pra uma professora-jornalista-escritora. Para um ser humano, ora essa. Nem sei de onde tiro a minha grande força, porque todos nós temos uma. Sem ela, não resistiríamos. Tem coisas sobre as quais não converso, tem coisas sobre as quais abuso no falar. Tenho manias, como mexer muito com as mãos quando explico algo. Ou, dizer: "Então...", quando vou começar uma frase. Todos temos nossos cacos, nossas horas amanhecidas, algum desprazer em certas tarefas, pequenas alegrias que nos instigam a continuar. Por isso, talvez, criei esse espaço há dois anos. Para poder me comunicar mais. Perder o siso, ganhar o riso. Mais ou menos assim. Tenho me revelado, portanto. Acalmo meu coração quando escrevo um post novo. Me deixo levar pelos comments e gosto de respondê-los um a um, com quem realmente percebe o outro. "Então"...agora vou me preparar para mais uma reunião antes de uma outra reunião. (risos). Quando passarem por aqui, não esqueçam, vocês são muito especiais para mim.