sábado, 13 de março de 2010

Cícero

Cìcero o livro folheou. Sentiu as rimas e o espaldar da poesia. Sorriu tímido, de uma timidez inventada há anos. Era mais para cativar as pessoas. Cícero leu em voz alta. E era bela sua voz, mais que o poema. Naquele instante, entende? O poema ficou menor porque a voz de Cícero era intensa e grave. Feito locutor de rádio. Cícero o livro tornou a folhear. Escolheu novo poema e descobriu-se nele. Isso é que era o bom da poesia, a gente encontrar-se nela. Cícero escrevia seus versos de insônia. Madrugadas esquecidas pelo Lexotan. Agora só pontua versos à luz do sol e quando chove fica mais inspirado. Olha o livro mais uma vez e sabe que podia ser qualquer poeta, mas é Cora Coralina. Então, desfaz os nós dos cadarços. Tira o tênis, retira as meias e caminha pelo tapete colorido. Se um dia tiver uma filha, resolve que se chamará Cora Coralina. Porque é nome diferente, de poetisa. Enfeita o olhar com uma premonição vaga do futuro: ele e sua Cora lendo poesia no jardim que ainda não existe. Gosta da ideia. Gosta de imaginar. É dado a devaneios. Cícero caminha e respira fundo enquanto ouve música de feng shui. Toca o tapete de leve, quase como se dançasse. Amanhã terá visita e poderá ler seus poemas. Ela se chama Vitória e ele pensa nela como conquista.

2 comentários:

Eduardo Matzembacher Frizzo disse...

Com certeza que o bom da poesia é se encontrar nela. Mais que a prosa, a poesia exige uma entrega e portanto um encontro que não existe em qualquer outra manifestação artística. Talvez nela resida a pergunta morta do olhar dos bichos - parafraseando Hilda Hilst. Mas ainda que não exista, nós podemos existir nela, sendo que é disso que se destila todo sentido e todo sentir para desfrutarmos do futuro vago que a todo momento nos persegue como um sopro quente no ouvido só. Um beijo, Eduardo.

Biba disse...

Olá Eduardo, sim, o bom da poesia é se encontrar nela e desfrutar aquele instante como único e inviolável.

Beijo,
Carpe Diem!!